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A mostrar mensagens de novembro, 2017

26.11.2017

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Encontrei-o quando já as dores cavalgavam no meu corpo e parei para ver o anoitecer. E para desculpar essa fraqueza do corpo que rapidamente alastra para o espírito e deixa-nos mais perdidos do que um velho tronco. 

O senhor Rui

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O senhor Rui quase sempre está ao telefone ou a fumar. Todos os dias, na Rua Direita, ali está ele de camisa aos quadrados e avental curto. Quando não o vejo é porque regresso demasiado tarde, já não há o frenesim dos colégios, do pára-arranca dos autocarros e ele já não está a chutar o tempo no passeio, em frente ao estabelecimento que governa. Eu vejo-o e acho que ele também me vê. Não sabe que me doem os olhos e que vou num processo de desligamento. Não sabe que vou a pensar quantas histórias terá ouvido ao balcão, enquanto serviu petingas ou pernil, se está contente ou aborrecido com o fornecedor do vinho de cooperativa. Não sabe que comecei o dia à espera que o semáforo abrisse e a ver a senhora que empurra o carrinho do neto sempre com aquele ar sorridente. E que a imagino vinda de leste, nessa presunção de esterótipo que poderia desfazer-se do mesmo modo, caso o neto seja filho. Está cada vez mais crescido o miúdo e, pelo menos, um ano já leva de ar irrespirável todas as manhã

Entre as mulheres, ao sábado à noite

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Como uma oração, essa fina catarse de riso, conversas e momentos enquanto nos foge o tempo medido em distâncias e histórias. Podem ser tantas quantas as que se guardam nos livros das estantes que nos rodeiam. E podem ser muitas mais se nunca deixarmos que a rotina amorfa nos sugue para o afastamento. Por sua vez, eles cantaram "Alentejanas e amorosas" e "Ai Margarida" em poemas ébrios de amor e nós brindámos firme a isso também. E à música de que os jovens talentos falam, com maior fervor que a paixão à tona da insconsciência alcoólica de Álvaro de Campos. Como uma oração. Bendita sois vois entre as mulheres. Ao sábado à noite. Fotos: Cine Teatro Garrett, Póvoa de Varzim. Vitorino Salomé, Camané e direcção de Diogo Costa.

Aquele abraço

Eu vinha no comboio. No banco atrás ele atendou o telefone e em cinco minutos falou muito e quase nada. Despediu-se com "aquele abraço" e eu voltei a ter a certeza de que, embora seja uma expressão de afecto, quase nunca me lembra o conforto desse laço. É "aquele" porque é único?  Quantas vezes repeteriam um abraço para que ambos saibam qual é? Das expressões mais comuns, sobre algo tão próximo e tão distante, no final.

Aquele outro domingo

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Passou um dia. O assunto já quase esgotou, as imagens da tragédia já chegaram a todos, os relatórios dos gabinetes e dos sub-gabinetes já estão em produção e daqui a alguns tempos esperemos que não seja uma nova tragédia. A do abandono. Depois de uma semana em que fizemos o mundo mais pequeno do que ele já é, trocando contactos, ideias, angariando e transferindo donativos, decidimos ir para fazer algo concreto. Alvorada em Lisboa e estrada fora até que se chega ao IP3 e nas primeiras indicações para Porto da Raiva e para a livraria do Mondego começa o manto de cinza e negro. A devastação. Imaginamos tudo e, no fundo, não temos o alcance de quem o viveu. Recuo a 2009 quando já só vi uma foto e um capacete em cima de quatro tábuas. Arrepio-me e rasam-me os olhos de água ao ver a coluna de camiões e carrinhas de ajuda das gentes de Esposende. Dali para a frente é o registo de casas queimadas, floresta ardida, barracões, carros, e armazéns destruídos. Ficaríamos a saber que bast