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A mostrar mensagens de outubro, 2020

Ougadamente

 Saímos da estrada principal e metemos pelo caminho ladeado por amieiros que terminava numa rua estreita com poucas casas. Numa delas, desfazia-se um ciclo, a arrancar videiras à terra e, mesmo que isso possa representar mudança e renovação, para mim, sempre que se arranca uma vinha é sinal de tristeza, de fim de uma era.  E enquanto subíamos na rampa de madeira de acesso ao restaurante passou o Gary Cooper de bicicleta, sem chapéu de western, mas com aquele ar cinematográfico que parecia abrir o quadro que estava por vir. Trazia duas romãs na mão e entregou-as a alguém que terá saído pelas traseiras do espaço. Não sabemos se por zelo, convenieência ou pedido especial. E depois, aguardámos na porta, filtrando aquele certo desalinho, as caixas de vinho empilhadas, as anunciadas noites de cultura ainda afixadas nos papéis, a ementa escrita a giz, as floreiras decadentes, a esplanada de onde se viam os chorões pendentes para as águas paradas da lagoa.  E aguardámos, já numa ...

Quino

Não tenho memória de ler os seus livros mas tenho presente a genialidade e intemporalidade da figura que criou - a Mafalda.  E do J. chegar com a sua camisa aos quadrados vermelhos e negros e aquele sorriso de miúdo que acaba de receber uma prenda há muito esperada. O livro era espesso, capa rija, uma versão completa de algumas obras, escrito em Italiano, um objecto muito bonito, com aquele cheiro acre dos livros novos. J. folheou, ter-me-á explicado algumas passagens e foi ali que percebi que o menino que ele sempre fora, estava ali. A doutorar medicina, amante do Ski, de rodear-se de mulheres bonitas e ainda longe de saber que nos veríamos uma última vez, em frente à praceta da estação de Campanhã. Para nunca mais saber se continuara a coleccionar o Quino, em que país vive. Passaram onze anos sobre o nosso último email. Não estou certa que ainda tenha o mesmo endereço, mas hoje escrevi ao J.  Para lhe dizer que o Quino viverá para sempre.