Três vidas numa garagem
06:30
Confirmo
os olhos rajados de cansaço no espelho do elevador e desço para a garagem.
Quando
abro a porta de segurança há luz em todo o piso e é então que a vejo.
Farda
vermelha, impecavelmente arranjada, aqueles saltos altos que não estando nos
meus pés me apertam como se estivessem. Cabelo numa trança e a maquilhagem de
quem vai receber um Óscar nos minutos seguintes. Dali a umas horas, o seu
sorriso com batom vermelho será a sua ferramenta de trabalho algures no espaço
aéreo. Será que sorri?
Estou
na garagem. Na mesma garagem onde me cruzo com o polícia simpático sempre que
chego muito tarde e onde me cruzo com ela sempre que saio muito cedo. Às vezes
é o contrário.
Não
chego a dizer-lhe “bom dia” porque já entrara no carro.
Vou
de sapatilhas, sem sensualidade apertada, o cabelo é a desordem do costume, o
rimel dos olhos sairá assim que os esfregar em sucessivos bocejos. Levo sono
e a consciência de que devo sorrir e fazer a diferença, como se de um polícia ou
hospedeira se tratasse.
23:48
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Ainda não sei se ela sorri. Também não sei se fiz a minha parte.
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