Dos medos

(foto by Flickr)

A trovoada. Em termos de dinâmica musical agora mesmo definiria-a como um fortíssimo diminuendo.Mas o medo, esse, prevalece. Já em miúda, quando as trovoadas violentas se encostavam sobre o mar e aí descarregavam toda a sua fúria, iluminando os céus com relâmpagos e trovões sonoros eu ficava hirta de medo, tentando tapar os ouvidos, enrolar-me nos cobertores e, numa ou outra ocasião chamar pela minha mãe ou ir para debaixo da cama. Se havia lugar a falhas de luz o espectáculo era maior.O meu. E de nada valeram as rezas a Santa Bárbara, nem tão pouco as romarias em jeito de cobrança de promessas em que a minha mãe fazia questão de pagar a fatiota da santa como se isto,por si só, pudesse purgar os meus medos. De nada valeu porque em toda a minha vida, sempre que ouvir um trovão irá passar-me pela cabeça morrer carbonizada por um raio. Não é medo da morte que eu tenho, é do raio. Ou do corisco. Com isto lembrei-me de um episódio em que, numa trovoada repentina, em pleno concerto de rua abandonei o grupo totalmente em pânico para me pôr a salvo.
Às vezes temos medos que, infundados ou não, podem diminuir a nossa capacidade de agir na adversidade, de respirar tranquilidade, de nos mostrarmos confiantes e seguros, por um ou por mais motivos.
E fazem-nos também pensar no que somos, do que é feita a nossa existência e porque prevalecem os sobressaltos.
Há medos maiores do que a trovoada,aqueles cujos estímulos não vêm de efeitos da natureza,há medos que construímos nós próprios, sem ser necessário haver relâmpagos ou trovões...Há medos que nos deturpam porque não se dissipam em segundos como a trovoada.

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