De branco nos pés
Sempre que me proponho a desafiar
o corpo numa corrida lembro-me da história das sapatilhas Ritex.
Eu corria e participava em provas
de desporto escolar, até que a música me deu a volta à cabeça e foram-se as
pistas e os campos de lama.
Eram elas, as gémeas de Aldreu
(ou seriam de Fragoso?), que ganhavam o 1º e o 2º lugar dos corta-mato da
escola. Eu ficava com o 3º lugar. Raramente os outros, mas esforçava-me muito e
sempre gostei das aulas de educação física. Eu não tinha roupa desportiva ou de
marcas e guardo para sempre a vergonha que foi uma prova distrital em que
equipas inteiras apareceram em licras a condizer. A nossa equipa era uma
mistura de calções de licra desbotados e uma tshirt fosse ela do que fosse. Mas
corríamos como se não houvesse amanhã.
Eu tinha uns ténis muito velhos, rotos, com
bonecada em cores desbotadas, que já deixavam entrar água e tinham sido
comprados na feira. Mas eram muito confortáveis. Até que, numas idas ao pronto a vestir da Tia Engrácia, vi os
ténis Ritex. Um branco imaculado, atacadores verdes florescentes e a marca do
lado, “Ritex”, em azul. O meu tamanho e a ideia de os ter a agigantar-se nas
várias idas ao pronto-a-vestir para saber como haveria de convencer a minha mãe
a dar-me os ténis. Eram perfeitos para levar daí a dias no corta-mato da
escola.
E depois de subir e descer a
freguesia, saber todas as novidades do pronto-a-vestir durante duas semanas os
ténis foram meus. E foi minha também a desilusão quando no primeiro km de
estrada eu já não podia de dores musculares, parecendo que carregava um peso
bruto nos pés. Quase não conseguia correr, as pernas, os pés, o corpo pesava e
a consciência também de ter deixado os meus velhos ténis em casa. E passaram as
gémeas e passaram outros e eu corria, de branco nos pés mas sem força para
mais.
Não sei se foi desta corrida, a
medalha de 3º lugar que ainda guardo comigo, mas quase certeza que não. Nesse
dia, aprendi que aquilo que é simples e sem aparência nos dá mais conforto e
segurança!
*não encontrei a foto dos ditos mas se há imagem viva da minha infância é deste par de sapatilhas!
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