Todos os ventos #1

Pareceu-me simpático, afável e despachado, quando liguei. E não lhe notei aquela estranheza na voz que, certamente, fazemos passar sempre que ouvimos do outro lado uma voz que não reconhecemos. Expliquei-lhe que não iria eu buscar o livro mas dei-lhe todas as indicações para que a transacção decorra como o esperado. (ainda não foi, será hoje, pelas dezoito horas em frente ao Zeno).
Encontrei o livro no website onde tudo se compra e vende. E estava ali. O meu último reduto de uma história que nem eu sei falar sobre ela. Custa oito euros e terá, se não lhe arrancaram páginas, a mesma história que li dez anos antes. E é o início de uma outra história. Ou várias, se quisermos desmultiplicar a importância das vivências, das memórias, desse lastro que uns dias é tanta coisa e noutros coisa nenhuma.
Um livro que é aquilo que ficou para trás. Com uma dedicatória esperançosa na folha seguinte à capa, com aquela caligrafia fininha e tombada. Elegante, diria. E assinado com o seu nome verdadeiro, não com o fictício com o qual nos escrevíamos. Não consigo lembrar-me do que dizia. Mas durante o tempo de leitura do livro, voltava sempre a essa página para reler o que me escrevera. 
Ficou para trás, algures no meio dos poucos livros que  levámos para aquela casa das poucas ruas acima da praia. 
E o senhor diz-me: "vai gostar, é sobre um homem solitário que faz uma viagem". E apeteceu-me corrigi-lo e dizer-lhe que não. Que é sobre um homem que faz uma viagem em solitário mas disse-lhe apenas que conhecia a história e daí o meu interesse no livro.
Pergunto-me se ainda terá o livro. Ou se se livrou dele como um objecto carregado de uma má sorte.


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