Nunca nos vergaremos

Ao medo.
Mas eu fui mais atenta a tudo, sem auscultadores para a música, mudei a rota no parque, andei apenas na zona pavimentada e não fui para a mata, onde há menos iluminação. E vi menos pessoas a passear os cães, a fazer exercício, a andar por ali, apenas. Talvez seja do frio - pensei. Tentanto afastar essa ideia dos acontecimentos das últimas semanas. 
As miúdas dos elásticos presos às árvores e dos pesos estavam lá. Mas também elas mudaram de estratégia. Prenderam os apetrechos logo na primeira árvore junto à entrada, numa zona bem iluminada e com acesso à estrada ladeada de prédios. 
Nunca nos vergaremos ao medo mas vamos com ele. 
Reparamos mais naqueles que se cruzam connosco e fazemos a sua radiografia pessoal e social. Olhámos por cima do ombro, exactamente como quando chegamos a uma cidade pela primeira vez e ainda não a sentimos nossa. E medimos em pensamento a brutalidade a que seremos capazes caso sejamos apanhados desprevenidos, com uma faca encostada à pele, de onde jorrará sangue quente. Esticam-se os músculos, nesse fervilhar de adrenalina em que imaginamos que se vence o mal com outro mal.
Nunca nos vergaremos ao medo, mas este nunca tinha sido tão dono e senhor de uma hora no parque.


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