A subida


Aqui há dias eu corria com a J. e íamos já em esforço, à espera dos derradeiros km finais.  Passámos o último abastecimento da prova, virámos à esquerda e ali estava ela: uma subida de matar os ânimos. Então eu contava à J. que nestas coisas da corrida para gente que não treina de verdade,  e não tem arcaboiço físico e mental como eu, dou comigo muitas vezes, durante as provas, a pensar nos homens ou soldados das guerras. Imagino-os sempre desnutridos, com fatos e mochidas pesadas, armas que não podem largar, botas pesadas que se enchem de lama e água e eles continuam a correr e a tentar sobreviver. Em que pensariam aqueles homens? Nos regressos às suas casas? Numa caneca de café numa manhã de orvalho?
Numa música de que gostavam? 
E contava à J. que penso nessas situações como motivo para eu não ter como não fazer as subidas e esforçar-me e deixar de ser coninhas.
Por estes dias, tenho-me lembrado desses homens. Não tenho corrido, é certo, por razões óbvias. Mas lembro-me todos os dias dos soldados das guerras, dos meus avós e pais que passaram fome, das mulheres que morriam nos partos sem assistência médica, penso também naquelas tantas  pessoas e em tantos países que foram torturadas pelos regimes e ainda contaram a sua história.
Penso em todos eles e nesse rasto de morte que tinham à sua volta e tento relativizar medos.
E fazer esta "subida" sem ser coninhas. 

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