[ corpo morto ]
Fica mais bonito este voyeurismo-confinado-à-janela, no verão.
No inverno, as janelas estão baças, dá vontade de escrever "pqp" mas quem lê somos nós. Eu, neste caso. Às vezes chove e a colina da Rocinha amanhece com aquela massa de nuvens carregadas, tornando tudo mais cinzento, mais triste. Os homens da-obra-que-nunca-mais-acaba trabalham à mercê do tempo e eu penso sempre que eles preferem menos frio e chuva nos ossos.
As varandas não têm os toldos esticados e as roupas estendidas, o que lhes dá menos colorido e aquela sensação de estarmos na Costa Amalfitana, mesmo sabendo que vemos a Pontinha ao fundo.
É certo que o terreno baldio em frente transforma-se num lago de Inverno, os patos da Gulbenkian vêm aqui fazer o seu Erasmus e essa é a parte mais bonita.
Mas os vizinhos não vêm tanto à varanda fumar e beber café, dando tempo para ele lhe ajeitar o cabelo na face dizendo algo bonito e romântico - espero e imagino eu - ou, simplesmente, lhe dizer para da próxima vez comprar cápsulas golden arabia extra pure.
No inverno, o meu vizinho surfista pendura o fato de surfar na varanda e eu quando reparo não percebo logo que é um fato e penso que está um corpo morto a rodopiar.
No verão, o meu vizinho estende a roupa todo nu e eu quando reparo percebo logo que está um corpo morto...
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